“Quem quer um kit Covid-19? Quem vai querer?”, diria Chacrinha

“Quem quer um kit Covid-19? Quem vai querer?”, diria Chacrinha

Hoje, dia 10 de julho de 2020, o Brasil ultrapassou a marca de 1,8 milhão de infectados pelo Sars-Cov-2, o novo coronavírus que deflagra a Covid-19. O total de mortes desde o início “oficial” da pandemia no país, segundo o Ministério da Saúde, é de 70.398, sendo mais de 1,2 mil nas últimas 24 horas.  Nos últimos dias, são contabilizadas mais de 1 mil mortes diárias e dezenas de milhares de casos novos de contaminação. Esta é a semana também que o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido)  testou positivo para a Covid-19,  confirmando uma situação esperada desde o começo do surto da doença, já que ele é um arauto das aglomerações e um crítico ao uso de máscaras e do isolamento social. 

O defensor da cloroquina começou imediatamente a reforçar a “propaganda” do medicamento, que até o momento não tem pesquisa científica que aponte que a droga faça alguma diferença no tratamento da doença. O FDA – Food and Drug Administration, nos Estados Unidos, já revogou a autorização para o uso emergencial da cloroquina e da hidroxicloroquina por lá.  A OMS suspendeu definitivamente os testes com a substância também, após várias polêmicas. 

Estima-se que o Brasil tenha um estoque de 1,8 milhão de comprimidos de cloroquina, produzidos emergencialmente pelo Exército Brasileiro a pedido do presidente. Essa produção levou a um gasto alto na compra da matéria-prima emergencial na Índia, que está em apuração pelo TCU – Tribunal de Contas da União (como está em apuração os gastos emergenciais com os respiradores em vários estados, com processos instaurados em alguns deles). 

A insistência no uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina continua gerando divergências pelo Brasil inteiro, com localidades que entregam este medicamento junto com outros, compondo diferentes versões de “kit Covid-19”, com azitromicina (um antibiótico), ivermectina (parasitário), zinco e outros remédios – todos sem comprovação científica. Essas iniciativas por parte de prefeituras levaram a ANVISA a lançar um alerta sobre o uso da ivermectina e a afirmação de que não recomenda seu uso contra a Covid-19.   

Lembremos que o uso da ivermectina contra a Covid-19 está baseado no resultado de testes em in vitro em laboratório  na Austrália, sem qualquer resultado de avaliação deste remédio em humanos até agora. Mas, uma importante questão é que vários outros medicamentos também se mostraram eficazes in vitro, como os corticoides, antivirais (Lopinavir + ritonavir em conjunto com Interferon beta-1b + ribavirin), o Remdesvir, a Heparina, a Dexametasona, entre outros. Por que um medicamento ganha os holofotes em detrimento de outros? Será o efeito áudio de whatsapp? 

Sinceramente, basta pesquisar e confirmar que muitos remédios se mostraram efetivos contra o vírus in vitro. Mas, os brasileiros  se “apegaram” aos mais baratos e acessíveis e transformaram em kits – cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina. etc. 

Então, eu me pergunto: cadê gente e médicos pleiteando o Remdesevir, medicamento que nem está disponível no Brasil, mas cujos testes clínicos apontam efetivos resultados na redução da taxa de mortalidade pela Covid-19  ou outros antivirais? Os  médicos brasileiros que receitam a ivermectina (que não tem comprovação científica) parecem ignorar e nem fazem pressão para que o Brasil entre na lista dos países que passarão a contar com o Remdesevir (que os Estados Unidos arrebanhou a produção).

Estranho ainda que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) faz testes clínicos sérios com a nitazoxanida e o presidente da República nem menciona este esforço científico, no qual o Brasil está investindo milhões de reais e que conta com a participação de vários hospitais e de 500 voluntários (cujo recrutamento não tem sido fácil). Por que ele não muda de discurso e larga essa fixação pela cloroquina? O que mais ele está tomando, já que o tratamento inclui sempre mais alguns remédios? E, por que, apesar de toda a sua “confiança” neste remédio, ele está sendo monitorado por meio de 2 eletrocardiogramas diários, para acompanhar o efeito da substância no coração? Quantas pessoas estão sendo submetidas à cloroquina sem ter qualquer tipo de monitoramento?

O mundo não estava preparado para uma pandemia. O Brasil menos que os outros, mesmo tendo tempo para se preparar para a “importação” do Sars-Cov-2. Quais lições vamos tirar de tudo isso? Só o tempo dirá…Nessa balbúrdia de medicamentos sem comprovação científica, penso que se o apresentador Chacrinha estivesse vivo, ele poderia sair por aí gritando: “Quem quer um kit Covid-19? Quem vai querer?”!     

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